O Projeto Griôtech, realizado pelo Instituto de Referência Negra Peregum em parceria com a Mozilla Foundation, foi selecionado pela Iniciativa Global para Integridade da Informação sobre a Mudança do Clima, uma coalizão internacional que reúne ONU, UNESCO, UNFCCC, o governo do Brasil e outros seis países (Chile, Dinamarca, França, Marrocos, Reino Unido e Suécia), além de organizações da sociedade civil comprometidas com o enfrentamento da desinformação climática.
Lançada em 5 de junho de 2025, a iniciativa recebeu 447 propostas de quase 100 países em apenas um mês. A escala e a diversidade das candidaturas reforçam a urgência global em proteger o debate público das campanhas de desinformação, da manipulação e de teorias conspiratórias relacionadas às emergências climáticas.
Contribuição brasileira no enfrentamento à desinformação climática
O Griôtech se destaca por atuar diretamente na compreensão dos fluxos informacionais, no mapeamento de vulnerabilidades e na construção de metodologias que fortalecem comunidades frente aos efeitos da desinformação — especialmente em territórios tradicionais e periféricos historicamente impactados pela crise climática.
A pesquisa desenvolvida no âmbito do Projeto Griôtech envolveu territórios como a Aldeia Multiétnica Filhos Desta Terra (Guarulhos/SP) e o Quilombo do Bracuí (Angra dos Reis/RJ), aprofundando a escuta e o diálogo com suas lideranças e moradores. A iniciativa contou ainda com a parceria dos cursinhos populares da UNEafro Brasil, Luizinha Pankararu e ILÈ ÈKÒ, ampliando a rede de colaboração e incidência comunitária.
Ao gerar diagnósticos e evidências sobre como a desinformação afeta esses territórios, o projeto contribui para ampliar o alcance das discussões internacionais conduzidas pela ONU, UNESCO e G20. Seu enfoque em justiça racial, diversidade cultural e saberes comunitários reforça a necessidade de abordagens climáticas que contemplem as realidades do Sul Global.
Para o Instituto de Referência Negra Peregum, a seleção do Griôtech representa um marco institucional. “Essa participação reafirma nosso compromisso com a justiça racial a partir do debate sobre integridade da informação, assegurando que a população negra tenha acesso a dados confiáveis para tomar decisões pautadas na verdade. Isso fortalece o processo democrático e contribui para o enfrentamento do racismo ambiental, além de combater as diferentes distorções sobre esse tema e sobre as mudanças do clima”, destaca Vanessa Nascimento, diretora institucional do Peregum.
A presença do Griôtech nesse esforço multilateral também amplia a visibilidade de experiências brasileiras e contribui para que políticas internacionais reconheçam as dinâmicas informacionais que atravessam territórios negros e tradicionais.
A pesquisadora e fellow da Mozilla Foundation, Marcelle Chaga, compartilha a relevância da seleção. “O Griôtech faz parte dessa lista de grandes nomes e organizações. O celeiro de inovações reunido pelo Governo Federal está sendo lançado agora durante a COP30, e para a gente é muito importante esse reconhecimento, porque a nossa pesquisa traz não apenas observações, mas, sobretudo, o olhar dos moradores dessas comunidades tradicionais, em uma metodologia participativa construída com eles”, afirma.
Marcelle Chagas alega que há uma dimensão de respeito cultural e de vivência histórica desses povos, o que faz com que o relatório ganhe projeção internacional e gere impacto não só na compreensão do uso da tecnologia por esses grupos, mas também na defesa da integridade da informação.
Participação global e centralidade do Sul Global
O Fundo da Iniciativa Global foi aberto a organizações sem fins lucrativos dedicadas à pesquisa, jornalismo investigativo e comunicação estratégica sobre integridade da informação climática. Das 447 propostas recebidas, 319 foram consideradas elegíveis, com forte participação do Sul Global:
- 26% da América Latina e Caribe
- 23% da África
- 18% da Ásia e Pacífico
Esse engajamento demonstra tanto a capacidade dessas regiões quanto a urgência em financiar iniciativas onde os impactos combinados da desinformação e da crise climática são mais severos.
texto| Mayara Nunes