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Rumo a Belém: Justiça Climática e Racismo Ambiental no Centro do Debate da COP30

16 / 10 / 2025

Articulação internacional em Brasília pavimenta o caminho para a COP30, destacando as vozes da população negra e quilombola na luta contra as desigualdades ambientais

Na noite do dia (13/10), o Hub Peregum, em Brasília, sediou o painel internacional “Rumo à COP30: Mobilizações por Justiça Climática e contra o Racismo Ambiental”. O debate focou na urgência de centralizar as demandas de justiça racial e climática, conectando ativistas e organizações dos movimentos negro e quilombola da África e do Brasil.

O evento, promovido pelo Instituto de Referência Negra Peregum, em parceria estratégica com a Pan African Climate Justice Alliance (PACJA), sediada no Quênia, e o Hlanganisa Community Fund, da África do Sul, marcou um momento crucial nas mobilizações globais que antecedem a 30ª Conferência das Partes da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), a ser realizada, neste ano, em Belém do Pará. 

O encontro reuniu representantes do governo, da sociedade civil e de organizações do Brasil e do continente africano para refletir sobre temas centrais como Financiamento Climático, Transição Energética, Adaptação e os Impactos das Mudanças Climáticas sobre o Direito à Educação, especialmente para meninas negras e imigrantes.

A pesquisadora e educadora Adriana Moreira, coordenadora do Projeto Firminas e Mahins, do Instituto Peregum, enfatizou o papel central da educação nas políticas de adaptação climática e combate ao racismo ambiental:

“Temos um enorme desafio: tornar a Educação um setor estratégico do plano de Adaptação Climática Global. O direito à educação não deve ser caracterizado apenas como fundamental; compreendê-lo em sua dimensão construtora dos demais direitos é elementar. Estou querendo dizer que ser uma adolescente negra e morar em um centro urbano no qual há rodízio de água, e sua casa não tiver caixa-d’água, é provável que nem sempre ela vá tomar banho para ir para a escola. Qualquer pessoa minimamente experimentada pelo racismo à brasileira pode imaginar as consequências de ter cabelo crespo e não poder tratá-lo adequadamente antes de ir para a escola. Essa é uma dimensão que pode parecer diminuta, do encontro entre racismo, escola e racismo ambiental. Entretanto, como o campo da justiça climática é relativamente distanciado do campo educacional (educação básica), os conceitos elaborados por esse universo pouco ressoam no cotidiano das escolas.”

A iniciativa dá sequência à agenda iniciada em maio, quando o Instituto Peregum realizou o painel “Do Campo à Cidade: Pequenos Agricultores, Racismo Ambiental e Justiça Climática”, em parceria com a Ação da Cidadania. Agora, no marco da Pré-COP30, o debate se amplia para os grandes desafios das negociações internacionais e para as formas de participação da sociedade civil no processo.

Ao reunir vozes diversas do Brasil e da África, o painel reafirma que enfrentar a crise climática exige colocar a equidade e a inclusão no centro das decisões globais. Rumo a Belém, seguimos mobilizando por uma COP30 que reconheça a urgência da justiça racial e climática como caminho para um futuro sustentável e inclusivo. 

Racismo Ambiental nas Cidades: População Negra em Áreas de Risco

Enquanto o Brasil celebra a redução no desmatamento em 32% e nas emissões de gases do efeito estufa em 12% entre 2022 e 2023, um alerta urgente acende no debate climático nacional: o agravamento do racismo ambiental nas cidades. Essa contradição será o tema central da mobilização da sociedade civil rumo à COP30, que acontecerá em Belém, em 2025.

Um levantamento recente do Instituto Peregum, com base nos censos de 2000, 2010 e 2022, revela a face mais cruel da crise climática no Brasil: o aumento das áreas de risco geológico em 18%, atingindo 16,6 mil locais e expondo cerca de 300 mil pessoas ao perigo.

O estudo aponta que, na região metropolitana de São Paulo, a população negra tem sido sistematicamente empurrada para as margens, em um processo contínuo de expulsão de áreas valorizadas. A falta de acesso a políticas de terra e moradia força essas famílias a se instalarem em encostas, várzeas e regiões com cobertura vegetal, tornando-as mais vulneráveis a deslizamentos e enchentes.

“O que estamos vendo é a reprodução do racismo estrutural no território. As políticas climáticas não podem ignorar quem está sendo mais impactado pelos desastres”, avalia Gisele Brito, coordenadora do eixo de Clima e Cidades do Instituto Peregum e uma das responsáveis pelo levantamento.

O alerta é reforçado pela análise do financiamento climático. Apesar de o Fundo Clima, principal mecanismo de financiamento da política climática brasileira, ter alcançado um orçamento de R$ 10,4 bilhões em 2024, apenas dois projetos de adaptação foram financiados no último ano. Peregum enfatiza que a ausência de critérios raciais e sociais na aplicação desses recursos aprofunda o racismo ambiental e compromete o compromisso de justiça climática previsto na Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do país.

Sociedade Civil na Reta Final para Belém

O painel da Pré-COP30 deu sequência ao processo de mobilização iniciado em maio com o evento “Do Campo à Cidade: Pequenos Agricultores, Racismo Ambiental e Justiça Climática”. O encontro em Brasília foi um espaço crucial de diálogo entre a sociedade civil e representantes do governo, com a participação de membros da Coalizão Negra por Direitos (Mônica Oliveira), Conaq (Biko Rodrigues), Adriana Moreira (educação e impactos em meninas negras), e representantes do Itamaraty e da Secretaria-Geral da Presidência da República.

A presença de lideranças internacionais, como Charles da PACJA (Aliança Pan-Africana pela Justiça Climática) e representantes do Hlanganisa Community Fund (gênero e racismo ambiental na África do Sul), reforçou a urgência global de pautar justiça racial e climática no processo multilateral.

Ao reunir essas vozes diversas, o painel “Rumo a Belém do Pará: Justiça Climática e Racismo Ambiental na COP30” reforça a expectativa de que a conferência de Belém não apenas lidere o discurso ambiental, mas garanta que a transição energética e as soluções climáticas sejam inclusivas e sustentáveis, colocando a equidade no centro das decisões globais. A sociedade civil organizada pressiona para que o Brasil não repita as injustiças do passado e garanta a participação efetiva das populações mais afetadas na conferência.

Texto| Mayara Nunes

Imagens| Ana Barbosa