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Soberania também é questão racial

24 / 07 / 2025

A ofensiva de Donald Trump impondo 50% de sobretaxa às exportações brasileiras e o lobby de Eduardo Bolsonaro para enquadrar ministros do STF sob a Lei Magnitsky — não é mera briga diplomática; é a reedição de uma prática colonial onde uma potência do norte global que impõe coerção econômica a um país do Sul global, para proteger uma família declaradamente racista. Essa manobra golpeia em cheio nossa soberania e, com ela, importantes instrumentos de combate às desigualdades raciais no Brasil.

A perda de soberania aprofunda vulnerabilidades sociais e econômicas que recaem com mais força sobre a população negra:

  1. Recessão induzida por sanções — tarifas e bloqueios derrubam exportações, encolhem indústria e agro. Trabalhadores, são a força de trabalho nesses setores; logo, são os primeiros a perder o emprego.
  2. Inflação importada — choque de preços em alimentos e energia pesa desproporcionalmente nos orçamentos periféricos; cada ponto de inflação alimentar empurra milhares de brasileiros abaixo da linha de pobreza.
  3. Austeridade imposta — para acalmar credores externos, governos cortam gasto social. A EC-95 já estrangulou o orçamento das universidades, ameaçando bolsas e cotas raciais de que triplicaram a presença negra no ensino superior.
  4. Sanções aumentam a desigualdade — análises mostram que países sancionados veem o coeficiente de Gini subir até 0,04 em cinco anos, com queda de PIB e piora de indicadores de direitos humanos.

Soberania como política antirracista
Defender a autonomia nacional significa liberdade para decidir um projeto de nação que redistribua poder e riqueza. Dirigidas por nós, a maioria do povo brasileiro, um estado soberano poderia permitir:

  • Reforma tributária progressiva e Fundo de Reparação Econômica Negra – viável apenas se o país controlar sua política fiscal, sem vetos de Wall Street.
  • Diplomacia Sul-Sul solidária – parcerias com África e Caribe reduzem dependência de um eixo hegemônico branco do norte global e ampliam voz dos povos racializados.
  • Blindagem jurídica – tipificar lobby estrangeiro contra instituições nacionais como crime de lesa-pátria, protegendo STF, cotas e leis antirracistas de chantagens.
  • Comunicação popular – explicitar que cada tarifa externa encarece a cesta básica e reduz oportunidades de trabalho e renda para a população que mais precisa.

Conclusão

O racismo precisa de estruturas para se manter orientador das dinâmicas de poder. Enfrentá-lo requer um Estado forte e soberano comprometido com esta missão. Quando uma potência supremacista branca tenta tutelar o Brasil, ameaça não só a Constituição, mas também a vida prática, o trabalho e o futuro da população. Defender a soberania — o direito do povo governar seu destino — é, portanto, um ato de justiça racial. Entregar esse direito seria como recolonizar o país e revogar, na prática, todos os avanços nas reduções da desigualdades que tanto lutamos para alcançar.

UNEafro Brasil e Instituto de Referência Negra Peregum