Com a aprovação de uma nova legislação que amplia para 30% a reserva de vagas para pessoas negras, indígenas e quilombolas em concursos federais, programas de inclusão como o Esperança Garcia mostram que políticas afirmativas não apenas abrem portas, mas transformam vidas.
A recente aprovação do Projeto de Lei 1958/2021 pelo Senado Federal, que amplia a reserva de vagas para pessoas negras, indígenas e quilombolas nos concursos públicos, reacendeu o debate sobre a inclusão racial no serviço público brasileiro. Mas, para além das cifras e estatísticas, a mudança já tem rosto, nome e trajetória. As trajetórias de Eva Patrícia, Yônaria Patrício e Rodrigo Ribeiro, sendo os dois últimos citados bolsistas do programa Esperança Garcia, são testemunhos concretos do impacto transformador de políticas de inclusão como o Programa Esperança Garcia.
Eva Patrícia: Mulher Negra e Quilombola rumo ao Tribunal Superior Eleitoral
Natural de Dourados (MS) e integrante de uma comunidade quilombola, Eva Patricia Braga Fernandes acaba de conquistar duas aprovações de peso: Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) e Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Para ela, o Programa Esperança Garcia foi fundamental.
“Essas aprovações, ainda que simples, provam que vale a pena continuar lutando, mesmo diante dos inúmeros problemas sociais que atingem a população negra. Nunca existiu um programa como este, que promovesse nosso acesso ao estudo para concursos públicos”, afirma.
Além do suporte acadêmico, Eva destaca a importância do acolhimento emocional em uma jornada marcada por sobrecarga, desigualdade financeira e racismo estrutural — desafios especialmente duros para mulheres negras.
Yônaria Patrício: O apoio que traz força para seguir
Também quilombola, Yônaria Patrício, do Tocantins, foi aprovada no concurso do TRF2. Sua trajetória ilustra como ações afirmativas podem romper ciclos de exclusão e abrir espaço para novas possibilidades.
“O projeto deu mais do que preparo técnico: me deu apoio psicológico, que foi fundamental. Enfrentamos tantas dificuldades que às vezes pensamos em desistir. O Esperança veio trazendo esperança literalmente, me incentivando a continuar na caminhada”, relata.
Rodrigo Ribeiro: Quando a estrutura faz florescer o talento
Do interior do Rio de Janeiro, Rodrigo Nogueira Ribeiro também é um dos aprovados nos concursos da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (PGE-SP) e da Procuradoria Geral do Município de Vitória (PGM Vitória). Para ele, o diferencial foi a estrutura completa que o programa oferece:
“Me senti fortalecido e consegui aprovações importantes graças à consolidação do meu conhecimento. O suporte pedagógico, financeiro e emocional foi decisivo”, conta.
Esperança Garcia: Um projeto de transformação social e reparação histórica!
O Instituto de Referência Negra Peregum, em parceria com a Advocacia-Geral da União e o Ministério da Igualdade Racial, implementou em 2024 o Programa Esperança Garcia. Iniciativa que tem como objetivo enfrentar a sub-representação de pessoas negras nas carreiras jurídicas. Com 130 participantes negros de todo o Brasil, o programa oferece formação gratuita, bolsa de permanência de R$ 3 mil, mentoria com servidores públicos, apoio psicológico e atividades voltadas à saúde mental.
Além das três aprovações já conquistadas, o programa se destaca por seu caráter interseccional: 70% dos participantes são mulheres, 50% são mulheres quilombolas, 9,2% são pessoas com deficiência e há presença significativa de estudantes do Norte e Nordeste, além de pessoas com mais de 50 anos e cuidadores familiares.
“Esses dados revelam não apenas quem está sendo incluído, mas como o desenho do programa oferece uma resposta concreta às desigualdades estruturais do serviço público”, afirma Beatriz Lourenço, diretora de Áreas e Estratégia do Instituto Peregum.
O futuro é agora
Com a nova reserva de 30% das vagas em concursos federais, a expectativa é de que os impactos observados no ensino superior se repliquem também no serviço público — ampliando a presença negra em espaços de poder e decisão. Como destaca Jéssica Ferreira, coordenadora do Esperança Garcia:
“Mais do que números, queremos transformar trajetórias. Cada aprovação é uma vitória coletiva contra séculos de exclusão.”
As histórias de Eva, Yônaria e Rodrigo não são exceção: são o início de uma mudança estrutural. Uma prova concreta de que, com investimento, oportunidade e apoio, o talento negro pode — e deve — ocupar todos os espaços.